ESCRITÓRIO COM CINEMA

ESCRITÓRIO COM CINEMA

No momento em que as pessoas buscam o conforto e a comodidade do trabalho em casa, o home theater entra em cena.

Reportagem de SIMONE DIAS

A evolução da tecnologia nas últimas décadas redesenhou nosso modelo de casa. Alguns recursos antes utilizados apenas nas empresas, como computador e fax, por exemplo, já são peças usuais na vida familiar. Essas transformações mudaram a feição da casa, que conseguiu atrair o escritório para seu espaço. Com a expansão do home theater, as duas tendências estão se juntando para preencher duas necessidades das famílias modernas: o lazer e o trabalho em casa.

Não só os equipamentos legitimaram o home office – escritório em casa. Em todo o mundo, o estresse causado pelo tráfego excessivo, a violência nos grandes centros urbanos e a descoberta, por parte das empresas e empregadores, de que é possível executar quase todo tipo de trabalho dentro do próprio lar, levaram os profissionais a se voltarem para as próprias casas. 

A projeção da ABRH (Associação Brasileira de Recursos Humanos) é de que na virada de 2000 para 2001 haverá, no Brasil, nada menos que 6 milhões de pessoas trabalhando em casa. Atualmente, segundo pesquisas da Fundação SEADE (Sistema Estadual de Análise de Dados do Governo do Estado de São Paulo), só na Grande São Paulo um em cada 20 trabalhadores já fazem parte desse time. 

E como se equipa a casa para este novo modelo? Para os mais exigentes, a montagem de um ambiente ideal para trabalho também significa equipar o espaço com home theater. Mesmo desaconselhável para muitos especialistas, que consideram o equipamento impróprio para ambientes de trabalho, o home theater pode, sim, coexistir com o ambiente projetado para o home office, sendo utilizado, inclusive, como um recurso de trabalho. 

Para o geógrafo Paulo Moraes, o projeto do tão sonhado home office implicava em um home theater integrado. Com um projeto prático e bonito, o arquiteto Luiz Trigo, de São Paulo, conseguiu materializar o desejo de Moraes. Há três meses ele desfruta do conforto do escritório em casa completamente equipado. 

Utilizando recursos de madeira e vidro, o projeto permite que a área fique isolada ou integrada, de acordo com a situação. “Tenho uma vida social intensa, recebo muitos amigos para jantar, por exemplo”, conta Moraes. “Nesses momentos posso ’embutir’ o escritório, com uma das portas e ampliar meu espaço”. 

No seu trabalho, todos os recursos são fundamentais. O home theater com DVD player é um grande instrumento para Moraes ver documentários, já que assistir a filmes do gênero faz parte da sua rotina profissional. Ele também é professor universitário e escreve livros didáticos. No apartamento de 130m2 em São Paulo, ele se diz realizado por poder trabalhar com o conforto que o home theater oferece. “Posso até ligar meu computador ao home theater”. 

Realização também é a palavra encontrada pelo dramaturgo e diretor de televisão Luiz Cabral, igualmente morador de São Paulo. Ele optou por ter todos os recursos para trabalhar em casa, com um home theater instalado ao lado de seu home office. Com um escritório despojado, que tem vista para o espaçoso jardim de sua cobertura de 200m2, Cabral desfruta de tranqüilidade e recursos para desenvolver bem seu trabalho. 

E o melhor: diretamente de casa. “Ali trabalho mais feliz. Evito o trânsito e me alimento melhor, além de ter toda a infra-estrutura para escrever meus roteiros. Também desenvolvo pesquisa teatral utilizando meu home theater. Vejo documentários e programas sobre essas áreas com a melhor qualidade de imagem e de som”, diz.  

Com dois filhos pequenos e casado com a diretora teatral Beth Lopes, Cabral tem em seu home office dois microcomputadores com placa de fax-modem, impressora, duas linhas telefônicas, telefone celular, secretária eletrônica. Compõe o mobiliário ainda uma estante – repleta de livros. “Meu escritório só seria mais completo se tivesse uma máquina de Xerox”!             

Com a empresária Regina Batista foi parecido. Com dois filhos – de 14 e 15 anos – ela instalou um home office com home theater, transformando a sala num local apropriado ora para trabalho, ora para entretenimento. “Sentia falta de um espaço que pudesse ser o ponto de encontro da família e onde pudesse trabalhar”, explica. Para o autor do projeto, o arquiteto Fábio Morozini, a proposta era criar uma sala que comportasse um TV de tela grande (37”) e equipamento completo de home theater em apenas 3,50x4m. 

O home office foi projetado com toda a fiação elétrica – tomadas, interruptores, caixas acústicas e iluminação superior – embutida nos lambris (revestimentos) em madeira pau-marfim, que reveste toda a extensão baixa das paredes. A acústica exigiu um trabalho minucioso de revestimento com materiais que absorventes. A parede em madeira maciça foi recheada internamente com manta de lã de vidro e as janelas receberam persianas de tecido. “Levou um ano e meio para ficar pronto e hoje é o ambiente mais aconchegante da casa”, diz Regina. 

Regina tem empresas agrícolas no interior do Estado, um escritório em Campinas e, morando em São Paulo, precisa estar informada sobre os trabalhos desenvolvidos em campo. “Temos reuniões semanais, mas converso todos os dias por telefone e me comunico por e-mail”, explica. O home theater, para Regina, fica restrito ao entretenimento. Ela diz que, na confortável sala do home office, o home theater é utilizado com a família para assistir a fitas de vídeo.

Na residência em que mora e trabalha, no bairro paulistano do Brooklin, a psicoterapeuta Emília Fukunaga também desfruta do seu home office. Em busca de melhoria da qualidade de vida e também para estar mais próxima dos filhos, há três anos ela levou seu consultório para a residência. 

Em outro ambiente da casa, Emília investiu na aquisição de um home theater. “Sempre fui apaixonada pelo cinema, que uso como recurso pessoal e também como complemento do meu trabalho. Consumo muito vídeo para manter-me atualizada e indicar obras que tenham a ver com o histórico de cada paciente”, explica.

A opção de Emília em não ter o equipamento de home theater integrado é aplaudida por muitos especialistas. Josias Cordeiro Jr., da Josias Studio, diz que perfis como este são os mais comuns no mercado. “Fica difícil administrar as tarefas com o home theater e o home office em um mesmo espaço. É mais comum em ambientes separados”, explica. 

Já para Roberto Aguiar, da Áudio&Vision, há um crescimento nas vendas de home theater integrado ao home office nos últimos tempos. “Há pessoas que usam o recurso do áudio e vídeo para apresentar seus trabalhos para os clientes, dentro do home office”, diz.

Os empreendedores da construção civil já apostam que a tendência do escritório em casa veio para ficar. Existem empresas, como a ABC Construtora, que lançou no final do ano passado o condomínio Versatile, no bairro de Pinheiros, em São Paulo, com 83 apartamentos e uma planta contemplando o home office – de 10m2 –  onde o morador tem entrada independente para o escritório. “O edifício ficará pronto em outubro de 2001, mas já temos metade das unidades vendidas. Há um número cada vez maior de pessoas que trabalham em casa”, diz Ricardo Pereira Leite, diretor da empresa.

O arquiteto Welington Fonseca, de São Paulo, confirma. “Hoje sou procurado por clientes antigos para reformar suas residências contemplando o home office. É uma tendência mesmo. É prático mexer na fiação e na parte elétrica pensando no projeto do home theater. E trata-se de um recurso usado tanto para assistir a um filme, como para apresentar trabalhos para clientes”, diz.

 

HOME OFFICE, UMA TENDÊNCIA


Estima-se que o SOHO (Small Office Home Office) seja responsável por 15% das vendas de equipamentos de informática no Brasil atualmente. A previsão é de atingir 40% em cinco anos. Essas informações encontram-se no livro Teletrabalho – O Trabalho em Qualquer Lugar e a Qualquer Hora, de Álvaro Mello, que relata uma transformação radical no conceito de escritório como estrutura física – em virtude, principalmente, da evolução da informática e das telecomunicações.


Nos Estados Unidos, o SOHO já ultrapassa os US$ 427 bilhões, pois 14 milhões de americanos trabalham em casa ´full time´ e outros 13,1 milhões trabalham só ´part time´. No Brasil, calcula-se que estejam em uso 6,7 milhões de computadores pessoais, sendo 2,8 milhões domésticos. De acordo com Mello, somente o Estado de São Paulo teria o índice de 11,7 PCs em cada 100 lares, uma estimativa animadora para os padrões brasileiros de consumo (nos EUA, o índice está perto de 40).


Mello, diretor da empresa Brasil Entrepreneur Clínica de Negócios, especialista na implantação de Homebased Business (“Negócio Próprio em Casa”) e autor de vários livros sobre o assunto, acha que trabalhar em casa tornou-se, além de uma alternativa de carreira, um modo de vida. Por isso, estrutura é fundamental. “Secretária eletrônica, celular e pager são fundamentais. Entre outras coisas a pessoa precisa acessar e ser acessado facilmente”, explica. Ele recomenda que a pessoa que trabalham em casa tenha objetivos claros sobre o trabalho a ser executado, para que o home office não se transforme apenas em local para execução de ´bicos´.